Tuesday, June 07, 2005

O CÃO AMARELO

Devem ser umas nove e meia quando chego à Sereia. Mar chão, céu azul sem mácula a confundir-se com a água no horizonte, uma brisa muito ténue e saborosa apesar da temperatura já ter ultrapassado um bom pedaço os vinte graus e o silêncio apenas quebrado pelo cantar das ondas mansas a morrerem na areia. Se há momentos quase perfeitos de sintonia com os elementos naturais, este é decerto um deles.
Durante uns minutos corro ao longo da praia, pés chapinhando a água fresca e revigorante, despojado do meu outro eu, deixado na cidade de betão, inundada de veículos estridentes, de gente que sonha realidades que nunca mais se cumprem, de gente que nem sequer tem sonhos e de gente de pesadelo que não permite que se sonhe.
Depois um cão, saido do nada, começou a acompanhar-me a corrida. Era um cão grande e amarelado, talvez já tivesse sido castanho mas o sol e a água salgada ao fim de uma ou duas épocas, dão aos animais esta côr estranha e pouco atraente.
Deixei de estar sózinho; o cão ladra mas não entendo o que pretende. Parei de correr. Começou a chegar gente que gesticula, grita, joga à bola, lê jornais e eu, sitiado, em pouco tempo serei apenas mais um entre tantos. O meu encontro com a natureza tem os minutos contados. Visto a t´shirt e afasto-me. O cão amarelo fica; provavelmente a fazer as honras da praia aos que pretendam ensaiar uma corridinha, pés chapinhando a água fresca e revigorante, despojados dos seus outros eus, deixados na cidade de...

18 Comments:

Blogger Fátima Santos said...

ai ele é isto?! ah!!!!!!!! eu pensava...mas quem me manda meter-me onde não sei...ora eu apensar...enganei-me no carreiro...Ah!!!!!!! afinal é isto?!!!! tá...eu fico aguardando a ver... BAI BAI

12:43 PM  
Blogger JPD said...

Olá Alberto!

Gostei muito deste texto.
Está muito bem escrito e muito bem montada a transicção da gente da cidade com sonhos frustrados ou, se calhar, sem eles, para a corridinha, o cão amarelo que poderia ser o toque dissonante, mas não chega a sê-lo, por apenas o autor ter reaparado nele. Curiosamente, o cão aproxima-se do autor e, deixando que os outros, aqueles que enxameiam a praia o repitam, tal não parece acontecer...nem sequer pela intensidade da cor, nem...
Um grande abraço

3:30 PM  
Blogger lique said...

O cão amarelo voltará a ter a praia só para ele quando a noite cair e todas as pessoas regressarem aos outros "eus" que deixaram na cidade de betão. E será só ele, o mar e as estrelas. :) Beijos

3:33 PM  
Blogger Mitsou said...

Gostei muito. E também só gosto de praias assim, a essa hora. Ou ao entardecer :) Beijinho grande.

3:55 PM  
Blogger anapaula said...

E não é que gostei! Esse caminhar na praia vazia ia saber-me tão bem ;)

4:49 PM  
Blogger mjm said...

Para mim, esta seria a melhor hora de procurar o cão amarelo, por isso, nunca seria capaz de o encontrar às nove e meia da manhã
:(
Devo dizer-te que gostei muito deste texto. A construção escorreita, e o remate circular, foram muito bem desenhados e o colorido do cão deu-lhe o ambiente final.
Não te maçarei com alusões a estereótipos, arquétipos e outros tipos... por hoje.
Os kisses, são os mesmos

5:43 PM  
Blogger Lyra said...

E os hábitos custam a ir-se. Parece que fica tudo á espera que derepente no fim do texto, apareça uma observação doida. :-) Que bom que não é assim! Viva a mudança!

8:07 PM  
Blogger Vênus said...

Bertus,
Volto pra deixar-te um desafio, veja no meu blog! Deixe o cão que lá está frioooo.
Bjs*.*

8:22 PM  
Blogger bertus said...

Para AZILUTHH:

Abro aqui uma excepção, compreensível, nestes comments, para te perguntar onde é que "moras" em termos estrictamente virtuais, claro. É que não consigo aceder ao teu blog.

Beijos.

1:28 AM  
Blogger Unknown said...

Ganda noia.
O blog é do porco, quem assina é o Bertus (blharc), quem abre excepções é o blharc.
Ah meu contrabandista de personalidades, vais ter que abrir muitas mais; os costumes e o povo estão intimamente ligados.

6:02 AM  
Blogger Menina Marota said...

É nessa horas, só nossas, mesmo que acompanhados de um cão amarelo, que a natureza se revela...

Adorei o teu texto, "vi-te" correndo pela areia, com o teu companheiro, mesmo que de momento, ao lado...

Essa é a magnitude da tua escrita... conseguimos ver, para além das palavras...

Um abraço e resguarda-re do sol, pelo menos a esta hora...:-)

7:36 AM  
Blogger gato_escaldado said...

cão na praia. faz tanta falta como na missa. depois querem turistas. "chat parisien c´est outre chose". rss

8:22 AM  
Blogger Unknown said...

é assim que se Vê o tão longe vão as mãos em direcção ao mundo ...

1:22 PM  
Blogger Raquel Vasconcelos said...

"Se há momentos quase perfeitos de sintonia com os elementos naturais, este é decerto um deles."


Em que tudo fica em paz...

Bem escrito. Gostei :)

5:06 PM  
Blogger Mushu said...

Bem! Isto é só para me dares trabalho! Lá tenho eu que mudar o link outra vez!

5:14 PM  
Blogger sotavento said...

Do cão nada a dizer, agora de ti, a voltar p'rá cidade em t-shirt e cuecas, nem sei que pense!... :)

4:03 AM  
Blogger ccc said...

Meu caro amigo,
Não que não gostasse do teu antigo espaço mas tu sabes que as sintonias eram feitas com o lado mais sério.
Sem qualquer surpresa mas muita satisfação te leio como sempre te imaginei :)

6:09 AM  
Blogger susana said...

:) que belo texto!mas acho que às 9.30 já o povo se apoderou da praia, no fim da tarde é k se torna maravilhoso :) tudo o k nos faz sair do outro eu...beijo

4:15 PM  

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